segunda-feira, 10 de junho de 2019

1 de maio 2019

[Caminhar oblíquo 06] Ainda não eram sete da manhã quando passei por Açores, uma aldeia com um singular largo de grande dimensões, com alinhamentos de plátanos muito podados. Pouco depois estava a atravessar a A25 e, logo a seguir, o rio Mondego. A partir desta linha o caminho seria quase sempre a subir até ao ponto mais elevado da serra da Estrela, onde previa chegar no dia seguinte. De permeio, na aproximação à serra, decido fazer uma pequena alteração ao itinerário. O calor que já estava na altura fez-me temer que muito dificilmente encontraria água nas terras altas. Decido apenas “atacar” a serra a partir de aldeia de Rapa, onde reabasteci. O mais provável seria apenas voltar a encontrar água no plano mais elevado da serra, que ainda estava nevado.
Açores. Celorico da Beira. 1 de maio de 2019
A25, Lajeosa do Mondego, prox. Celorico da Beira. 1 de maio de 2019
Rio Mondego. Lajeosa do Mondego, prox. Celorico da Beira. 1 de maio de 2019
A partir de Rapa sigo pela estrada que se dirige para Aldeia Viçosa. Ao chegar à portela, depois de uma distância de cerca de um quilómetro, inflito à direita, na direção sul. Doravante iria caminhar por essa linha das mais elevadas cotas do eixo Montejunto-Estrela. Era este o principal objetivo desta caminhada.
O desnível é agora relativamente acentuado, em cerca de um quilómetro e meio subirei de uma cota de 735 metros para os 985 metros, no vértice geodésico Soida. Há nuvens nesta aproximação ao alto das montanhas. Oiço foguetes. Não longe do vértice geodésico está um grupo relativamente grande de homens a prepararem um almoço. Atravesso o grupo como se fosse transparente, parecendo que ninguém reparava em mim. Avancei. A vontade de comer umas febras grelhadas não se concretizou. Havia um número considerável de automóveis dispersos pelas bermas do estradão que levava àquele ponto, que, por sua vez ficava no prolongamento da via de acesso a um parque eólico que se desenvolvia um pouco mais a sul e que se prolongaria por alguns quilómetros de cumeeira.
Soida, prox. Celorico da Beira/Guarda. 1 de maio de 2019
Desta linha comecei por avistar o cabeço do Tentinolho, na direção nascente e, pouco depois, tinha a Guarda no horizonte, a mais elevada cidade portuguesa. Parecia muito perto, embora estivesse a cerca de 10 quilómetros, em linha reta, do ponto em que me encontrava. Para norte via, com grande clareza, a serra da Marofa que tinha contornado há apenas dois dias. Esta montanha era, desde o início, um marco do meu caminhar, uma referência visual. A leitura do horizonte era a afirmação de um certo poder do movimento pedestre, de que não nos apercebemos com clareza quando nos deslocamos sobre rodas. Impressiona esta perceção da distância que como que nos transporta a um tempo muito recuado, deambulante e nómada, e, simultaneamente, se oferece como espaço inusitado de liberdade e independência.
Soida, prox. Celorico da Beira/Guarda. 1 de maio de 2019
Não tardaria estava junto aos campos cultivados da Cabeça Alta, os mais elevados solos agrícolas de todo o espaço português. Esta é uma área da montanha em que observamos as terras de xisto e, não distantes, paisagens onde o granito é dominante. A topografia da linha de festo é bastante plana. A serra da Estrela tem cerca de 60 quilómetros de extensão, se traçarmos uma linha desde Lajeosa do Mondego até à Torre.
Cabeça Alta, prox. Celorico da Beira. 1 de maio de 2019
Esta viagem era como um imperativo e uma urgência, mais uma tentativa de entendimento do impalpável solo que nos ergue como humanos, dentro de uma cultura determinada que foi sendo construída ao longo de milénios. Desenho uma linha, um infinito conjunto de paisagens, de partidas para lugares próximos ou distantes. Desejo de regresso a pontos observados no passado, mas também de futuro. Estar profundamente dentro e comprometido com a terra, com os lugares concretos que nos acolhem, que nos abrigam, que nos expõem a um clima duro. Este é o meu país.
Cumeada, prox. Gouveia. 1 de maio de 2019
Ao fim da tarde, num pequeno bosque, interrompo a caminhada. Era um bom local para passar a noite, abrigado do vento e de alguém que por ali pudesse passar. Não passou ninguém. Se na noite anterior tinha ficado junto de uma autoestrada, agora estava num recanto vegetal antes de avançar para as penedias ciclópicas do alto da montanha. Estava perto da Portela do Folgosinho. Fazia-se já sentir a descida da temperatura
Sorte da Velha, prox. Gouveia. 1 de maio de 2019

Dia: 2019/05/01, quarta-feira
Lugar referência: Cabeça Alta
Pernoita: Portela do Folgosinho, prox.
Quilómetros percorridos: 35,2
Quilómetros acumulados: 132,4
Concelhos atravessados: Celorico da Beira; Guarda; Gouveia
Cartas militares: 192; 203; 202
Fotografia inicial: dg898141, 06h20
Fotografia final: dg898370, 19h51
Duração trabalho fotográfico: 13h31
Fotografias: 230
Somatório fotografias: 1587
Fotografias selecionadas: 43 (18,7%)

3 comentários:

  1. Eu nem sei se o que comento chega às suas mãos. Isto é um bocado sofisticado para mim. Já agora se não for pedir muito podia dizer-me se os meus comentários lhe chegam às mãos. Grata.
    Gostei desta viagem e do que li. Soube a pouco. Depois diga se recebeu.

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  2. Estive a reler o seu "diário" e está aqui um comentário meu. Creio que os outros se perderam.
    Ao ler o seu "diário" dou-me conta da sua ignorancia total ao que se passa no.mundo. E, no entanto, o Duarte continua com o seu projecto, todos os dias avança, novas descobertas e muito trabalho para fazer.
    As novidades velhas como o mundo continuam a causar problemas aqui e ali e a sua vida mantem o projecto a andar em nada sendo beliscado pelo que de mal vai acontecendo.
    Às vezes até parece fácil
    Parece.
    Boas fotos

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