[arquitetura 30] Não negamos a importância dos grupos, mas há caminhos que teremos, inapelavelmente, trilhar em solidão. Poderemos ter que negar ideologias ou credos com que não nos identificamos, sentir, também, o fascínio do caminhar sobre as montanhas ou no deserto, porque o desconcerto de um mundo em permanente procura de equilíbrio é de uma enorme sedução.
Fotografar um território vasto. Procurar em Portugal as raízes de uma identidade coletiva que se perde num tempo longo. Construir um arquivo fotográfico. Reinventar uma paisagem humana, uma ideia de arquitetura, uma cidade nova.
sexta-feira, 31 de março de 2017
quinta-feira, 30 de março de 2017
Negar
[arquitetura 29] A arte, a poesia, a música, o amor, pedaços de matéria, um seixo rolado na beira mar, uma nuvem, uma caneta, são quanto nos pode pôr em contacto com dimensões do pensamento que transcendem no imediato as questões de um quotidiano meramente funcional. Ou o sorriso dos nossos filhos, o amor por um ente querido, ou mesmo a falha, o erro, são elementos que nos prendem a uma cosmogonia existencial, sem a necessidade de qualquer divindade.
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Serra da Estrela. 1996 |
quarta-feira, 29 de março de 2017
Regresso a outra matéria
[arquitetura 28] A vida, pó, é povoada de combates. Um dia regressaremos ao vazio que nos antecedeu, à matéria de estrelas de que os nossos átomos já fizeram parte. Uma vida humana é um fascinante hiato temporal, não muito diferente, em quase tudo, da de qualquer outro ser vivo que connosco partilha este planeta. Questionamos a nossa existência, tudo o que nos envolve, temos dificuldade em aceitar a morte, inventámos a eternidade e outras figuras mitológicas. Queremos que a vida tenha um sentido, mas também teremos que aceitar a possibilidade do contrário. Somos, mais uma vez como qualquer outra espécie biológica, lutadores pela continuidade e sobrevivência.
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Fortaleza do Ilhéu. Funchal. 1992 |
terça-feira, 28 de março de 2017
Procurar no vazio
segunda-feira, 27 de março de 2017
Há horizonte
[arquitetura 26] Poderíamos ser levados a pensar que este mundo da arquitetura é relativo à matéria. Não apenas. Há horizonte para além dessa ideia imediata. É a arquitetura que nos relaciona com algumas das mais elevadas condições de humanidade. A casa que verdadeiramente habitamos, não é feita de paredes. Não negamos uma ideia de religiosidade, mas aqui queremos deixar expressa a liberdade de palavra, pensamento e ação, como condição de procura.
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Porto Santo. Madeira. 2006 |
domingo, 26 de março de 2017
Atenção e liberdade
[arquitetura 25] Os arquitetos são um olhar atento e rebelde, comprometido e livre, ambicioso, são a visão que se detém no horizonte longínquo, que vê através das opacidades, são o pensamento que se debruça sobre as contaminações do espaço sobre o tempo. Os arquitetos são quem desenha a utopia, a casa do ser e das comunidades, o esquisso do cosmos contraditório, complexo e evolutivo, que habitamos.
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Évora. 2006 |
sábado, 25 de março de 2017
Cruzar
[arquitetura 24] Os arquitetos não são poetas, não são escritores, não são artistas, nem políticos, não são investigadores científicos, não curam pessoas, não são professores nem estudiosos ou investigadores, juristas. São seres complexos que têm uma formação que cruza diferentes ramos de conhecimento. Contêm dentro de si paisagens vastas, planetárias, onde todas as experiências de vida parecem confluir em fontes de criatividade.
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Escola Superior de Artes e Design de Caldas da Rainha. 2000 |
sexta-feira, 24 de março de 2017
O povoamento da terra
[arquitetura 23] Em considerações sobre a evolução humana e os modos de povoamento, verificamos que todos os passos estão “documentados”, de todos há vestígios deixados no solo. É a construção de uma “casa” ao longo de milénios. Em praticamente todos os lugares da Terra existem marcas de povoamento humano, mais ou menos recuadas. São os fazeres para a construção de um habitat próprio. São a procura de recursos de alimentação e pontos de fixação. É a história de um percurso de, simultaneamente, construção e destruição.
quinta-feira, 23 de março de 2017
Memórias para a fuga
[arquitetura 22] As memórias de um espaço fixado pela fotografia são as memórias da própria vida. Quando olhamos para trás, percorridos centenas de milhar de quilómetros, vemos um espaço imenso, difícil, cada vez mais difícil, de objetivar. Trazemos um conjunto vasto de fotografias, tentamos fixar o que foi essa grande e única viagem. O que fica nas imagens não são os lugares que registámos, mas uma complexa realidade de espaço-tempo em “fuga”. Procuramos o espaço que habitamos e o retrato de uma cultura. Encontramos o desenho de um percurso civilizacional vertiginoso, de afastamento da natureza, num perigoso limbo de apagamento das raízes do nosso próprio ser.
quarta-feira, 22 de março de 2017
Fixar identidade
terça-feira, 21 de março de 2017
Não ser
[arquitetura 20] Talvez seja mais fácil dizer o que não é, aqui, a fotografia de arquitetura, ou o que não se procura com as imagens de território. Esta fotografia não quer ser um quadro para pôr na parede, não quer ser um documento da realidade, um registo frio. Nem tão pouco quer ser fotografia de arquitetura, apêndice de divulgação de obras ou lugares. Quer ser liberdade e cosmos, infinito, reflexo de palavra poética, casa do ser, mundo topológico à procura da coerência do ponto vago e fugidio de um lugar de equilíbrio.
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Évora. 2006 |
segunda-feira, 20 de março de 2017
Antes, depois
[arquitetura 19] O antes e o depois das fotografias de arquitetura não é fácil de definir. O princípio é a imersão indistinta num mundo fascinante que se quer conhecer. Quando se adquirem ferramentas para o entendimento do espaço e da arquitetura, há uma realidade que se torna, em nós, progressivamente mais complexa e indeterminada. Como no fim de uma viagem, quando olhamos para trás, vemos o infinito em frente. O vazio paradoxal, inquietante e pacificador.
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São João da Madeira. 1998 |
domingo, 19 de março de 2017
Recusar a perfeição
[arquitetura 18] A fotografia de arquitetura é, neste contexto, a recusa de uma beleza imediata, de um momento perfeito, ou decisivo. A fotografia é a luz da hora, a crueza dos elementos, o olhar despojado, a ausência de artifício, o discurso da matéria e não tanto do fotógrafo, o contexto vasto de uma implantação de um edifício, de uma presença humana, no seu entorno. A descodificação de topologias, de relações visuais inscritas no espaço vasto e no tempo longo.
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Madeira, 1992 |
sábado, 18 de março de 2017
Fotografia como arquitetura
[arquitetura 17] Numa reflexão sobre a arquitetura não poderá deixar de haver, aqui, um olhar sobre a fotografia, fotografia como representação do espaço e do tempo. Há as fotografias que se aproximam da arquitetura quando, talvez, ambicionarem, deixar de ser “fotografias”, imagens isoladas que querem ser “pintura”. A fotografia é de uma natureza extremamente ambígua e fugidia. São múltiplos que refletem uma contemporaneidade à conquista das dimensões extremas do espaço e do tempo. Constantemente, a procura de uma definição de imagem, é infletida em novas direções de interpretação. A demanda de uma “última” imagem conduz aos territórios da perda de referenciais, vertigem, viagem continuada na imobilidade, impossibilidade de parar.
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Itinerário entre o Pico do Areeiro e o Pico Ruivo. Madeira. 1992 |
sexta-feira, 17 de março de 2017
Sem betão
[arquitetura 16] Fazer arquitetura sem projeto de edifícios é como a construção da casa do ser. Este poderá ser um extremo, a compreensão mais vasta da ideia de arquitetura. Assim a entendemos neste espaço de comunicação e partilha de algumas ideias que decorrem do exercício de um saber ambíguo construído paulatinamente em procura constante dos seus limites, de um território em expansão.
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Casa dos Sonhos, Jardins Efémeros, Viseu. 2016 |
quarta-feira, 15 de março de 2017
Sobreposições
[rgf 25] Teresa Goes Ferreira e eu, Duarte Belo, somos arquitetos. Os nossos pais morreram no mesmo ano de 1978, com pouco mais de um mês de diferença. Rui Goes Ferreira, nascido em 1926, tinha 51 anos. Ruy Belo, nascido em 1933, tinha 45 anos nesse mês agosto. Chama-se Teresa a mulher de cada um deles. Em áreas diferentes, mas ambas de forte pendor criativo, deixaram obras relevantes, que poderão tornar mais significantes as vidas de quem as conhecer.
Procuramos compromissos entre passado e futuro, procuramos em quem nos rodeia, nos pais e nos filhos, laços que prendem, muitas vezes desconexos, vidas humanas. Uma dança maior em torno de seres, coisas, fragmentos.
Este movimento é sobre a perseguição de um homem, é a procura de nós próprios, de quem somos, do sentido da nossa vida na rede multidimensional que habitamos, povoados que somos de memórias e futuro expectante entre caminhos que se bifurcam, caminhos que se encontram. [Este é o último post da série rgf relativo ao arquiteto Rui Goes Ferreira].
[Para mais dados sobre o arquiteto Rui Goes Ferreira, consultar: http://sobreruigoesferreira.blogspot.pt/]![]() |
Queimadas. Madeira. 2016 |
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Porto Santo. 2016 |
terça-feira, 14 de março de 2017
Ruas da madrugada
[rgf 24] Olhamos as fotografias da última madrugada no Funchal. A noite vai dando lugar ao novo dia, a vida recomeça. Observamos o edifício do largo da Igrejinha, com projeto de Rui Goes Ferreira e Manuel Vicente. Aqui está o entendimento do desenho das cidades, onde sempre se tem que contar com um ambiente de formas de elevada complexidade. É este o mundo que habitamos, as cidades, milhares de pessoas desconhecidas, próximas. A arquitetura é o território comum que edificamos. Antes de partir em viagem, num nome aparentemente perdido encontrámos uma personagem fascinante. Viagens de humanidade.
[Para mais dados sobre o arquiteto Rui Goes Ferreira, consultar: http://sobreruigoesferreira.blogspot.pt/]
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Largo da Igrejinha. Funchal. 2016 |
Velocidade e paradoxo
[rgf 23] Parece haver em toda a vida de Rui Goes Ferreira uma urgência, uma corrida contra o tempo, como que a consciência de uma morte à espreita. No entanto a obra edificada revela uma enorme sobriedade. É consciência do valor social da arquitetura, de serviço à comunidade; é uma funcionalidade muito bem articulada; são os pormenores de desenho complexos e de enorme refinamento. O traço inovador, num território onde havia uma modernidade quase inexistente. Um caminho desbravado em solidão que agora reencontramos com espanto e perplexidade.
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Detalhe de escada em edifício de habitação. Porto Santo. 2016 |
segunda-feira, 13 de março de 2017
O topo da ilha
[rgf 22] Há um projeto de Rui Goes Ferreira para um miradouro no Pico do Areeiro. Nunca foi construído. Há vários desenhos guardados no seu espólio que nos permitem imaginar aquele espaço modificado. O que entretanto foi edificado em nada se assemelha à proposta que ficara no papel. O lugar é extremo. É um dos pontos mais altos da ilha da Madeira. Um mundo quase irreal que se ergue da floresta para tocar o céu. Este era o ponto derradeiro desta viagem de levantamento fotográfico da obra de Rui Goes Ferreira. Daqui seguiria para o aeroporto, para regressar a Viseu. De uma semana para conhecer um arquiteto, trazia a vida de alguém que perseguiu o mais fino detalhe do desenho, da arquitetura, da interminável luta por um lugar humano.
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Pico do Areeiro, Madeira. 2016 |
Mãos sobre o papel
[rgf 21] Objetos de um ofício, e uma profissão que se alterou com o tempo. Alteraram-se as metodologias, os processos, mas toda esta voracidade contemporânea foi também acompanhada pela alteração dos modos de edificar, dos materiais de construção, da imagem das cidades, do mundo que habitamos. Um afia-minas de lixa fala-nos do tempo quase perdido dos desenhos a lápis, dos esquissos, do papel, das mãos com tinta e pó.
[Para mais dados sobre o arquiteto Rui Goes Ferreira, consultar: http://sobreruigoesferreira.blogspot.pt/]
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Espólio de Rui Goes Ferreira. Funchal. 2016 |
domingo, 12 de março de 2017
Identidade
[rgf 20] Na casa da Torrinha encontramos retratos de Rui Goes Ferreira, uma imagem, um rosto, um busto, os vestígios de uma face que procuramos nesta viagem por dentro da sua arquitetura. Estes retratos guardam silêncio. São representações de alguém que continua a existir. Espelham a sobriedade das formas que desenhou.
[Para mais dados sobre o arquiteto Rui Goes Ferreira, consultar: http://sobreruigoesferreira.blogspot.pt/]
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Rui Goes Ferreira. Funchal, 2016 |
Torrinha
[rgf 19] O espólio de Rui Goes Ferreira encontra-se, neste momento, no sótão da casa de família na rua da Torrinha, no Funchal. É um ambiente de casa antiga que nos transporta e nos enquadra num tempo passado. Da varanda temos uma vista ampla sobre a cidade. Esta cidade mudou profundamente nos últimos 40 anos. Esta mesma casa integrava um perímetro de quintas que fazia a transição do núcleo histórico, junto ao mar, para a floresta das cotas mais elevadas e, mais além, para as montanhas. Hoje este é um território despedaçado à procura de uma nova coerência. A pressão urbanística das últimas décadas levou a um desaparecimento quase completo das antigas quintas e as construções encavalitam-se, encosta acima, sem qualquer planeamento.
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Funchal, 2016 |
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Funchal, 2016 |
sábado, 11 de março de 2017
Quotidiano em falta
[rgf 18] Os documentos dispersos que se encontram num espólio são quase sempre uma estrada que se abre a diferentes leituras. São fragmentos de um quotidiano que tentamos seguir mas onde faltam inúmeras peças para a composição do puzzle. Uma realidade que nos deixa apontamentos, passos, preocupações, leituras quase que pedaços de intimidade que nos permitem entrar no universo de pensamento de alguém que nos deixou há quase 40 anos.
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Documentos do espólio de Rui Goes Ferreira. Funchal. 2016 |
Boaventura
[rgf 17] O que se encontra, na Madeira, atualmente, é agora um território de enormes contradições, mundos divergentes. A arquitetura de Rui Goes Ferreira permanece, nalguns casos com alterações, mas, de qualquer modo, perfeitamente reconhecível, como se os projetos nos propusessem uma forma perfeita, adaptada a um futuro desconhecido. Funciona como uma referência de uma integração no lugar que prende a tradição agarrada à terra, de bem construir, com um desejo de habitar assente em valores de conforto e modernidade.
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Casa do Povo de Boaventura, São Vicente, Madeira. 2016 |
sexta-feira, 10 de março de 2017
Casa de Susana Goes Ferreira
[rgf 16] Numa pausa no levantamento fotográfico da obra de Rui Goes Ferreira visitamos uma casa de Susana Goes Ferreira, a sua filha mais nova. De um caos urbano envolvente, há um bloco de betão que se ergue, de um jardim tímido, sobre dois pilares. Da rua não nos apercebemos das múltiplas dimensões daquele espaço. Quando entramos toda aquela urbe desconexa desaparece. Em frente abre-se o imenso oceano, como se toda a casa tivesse sido desenhada para o observarmos, para lermos no seu aparente vazio a inesgotável sedução do planeta que habitamos. Estamos em frente de uma paisagem cósmica que é “construída” por uma peça de arquitetura. É esta uma das seduções maiores da Arquitetura: a definição de um lugar humano que, em passagem, edifica o sentido da nossa própria existência. (O projeto desta casa é de Teresa Goes Ferreira, quem primeiro deitou mão à procura da obra de seu pai, que haveria de ser continuada por sua filha Madalena. Aqui se encontram três gerações de arquitetos).
[Para mais dados sobre o arquiteto Rui Goes Ferreira, consultar: http://sobreruigoesferreira.blogspot.pt/]![]() |
Casa de Susana Goes Ferreira. Caniço, Madeira. 2016 |
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