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Castelo de São Jorge. Lisboa. Abril de 2012 |
Num momento em que Portugal parece estar à beira de um prolongado colapso que fará tremer a sua própria existência num prazo não muito longo, olho em volta, para o chão que pisamos, e encontro as marcas de uma cultura milenar, cuja raiz se encontra bem mais recuada que a fundação da nacionalidade. Não creio que a culpa da situação que se vive atualmente seja do sistema económico, ou dos mercados financeiros. Vivemos, creio, um dos mais desafortunados momentos da história europeia. Há a reunião de uma invulgar constelação de governantes e dirigentes incompetentes que tomou posse nos mais elevados cargos de países e instituições europeias. Portugal é disso um bom exemplo. A alienação e falta de sentido de Estado de quem neste momento está no poder, em quase todas as oposições e mesmo noutras instituições, apresenta-nos um horizonte de fome para um elevado número de cidadãos.
Os Portugueses não são maus, não são preguiçosos, não são estúpidos, são, na sua enorme maioria, trabalhadores briosos que querem desenvolver as suas atividades, continuar a viver e a construir a Nação das gerações que nos antecederam. Nem creio que precisemos de um pai, de uma moral ideológica mesquinha, ignorante e gananciosa. D. Sebastião não vai voltar. Mas também não precisamos de governantes, dirigentes políticos, que, sem o mínimo de pudor, nos mostram a sua mais fina incompetência e arrogância, sem que delas tenham a mínima noção e que nos prometem o colapso eventual de uma democracia, ou um impensável recuo civilizacional. Continuamos dentro de uma Europa que conquistara o mais elevado desenvolvimento humano do planeta.
Gostava de, em 2013, continuar a fotografar e a trabalhar sobre o espaço português, sobre este tão grandioso lugar de diversidade e afirmação tenaz de uma cultura e de uma língua. Continuar a procura da palavra, a partilha da expressão de um sentir e de um universo de vivências. Continuar os passos encetados com algumas pessoas que conheci neste ano corrente, ou que reencontrei. Trabalhar as memórias, pessoais e coletivas, e a continuada construção do passado.
Nunca fiz balanços de anos passados, mas sobre este ano 2012 avanço algumas linhas. Antes de mais talvez seja aquele em que definitivamente se dissiparam todas as dúvidas sobre a negação do autismo do meu filho Afonso, a quem esse espectro de comportamento fora diagnosticado no Hospital Pediátrico de Coimbra, história de que dei conta recentemente aqui, na Cidade Infinita. História que a meus olhos é como uma metáfora do tempo presente ou a afirmação descontrolada do erro. Mesmo tendo uma tremenda confiança no meu filho, há dúvidas que nos assaltam pontualmente. As crianças dizem-nos, já mo dissera o meu filho mais velho, Pedro, que a vida é um "pontapé para a frente", é a impossibilidade de nos opormos à seta do tempo, à evolução contínua dos seres vivos, de todas as coisas, do pensamento humano. A vida é uma dança, um imponderável equilíbrio, um grande salto. É também, em mim, o acreditar de um enorme vazio que nos rodeia, no qual erguemos uma ilha de racionalidade, um monumento à descodificação progressiva dos mais densos mistérios, à expressão do pensamento aleatório e descontínuo, ao mundo do risco, do traçado numa folha branca, o enunciar de uma arquitetura renovada ou um habitar singular e único. Admirar quem corre sem um fim aparentemente objetivo, quem salta e voa uma fracção se segundo.
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Praia do Castelejo. Agosto 2012 |