[Lugares livres 30] No Caramulo, estava a conhecer, a percorrer pela primeira vez, um país imenso. Em Montemuro cruzara-me com um rebanho transumante, que viera da serra da Estrela três meses antes, numa viagem em busca dos pastos de altitude, onde a humidade permanece, resiste aos mais quentes estios. O Douro é um rio imenso feito de água e vinho, de tragédias e intermináveis lutas, a expressão de uma geografia dura que pontualmente se manifesta num caudal avassalador e destrutivo, a fúria a caminho do imenso oceano, no fim da terra, ou o apontar para mais longínquas viagens. Na Estrela, numa viagem ocasional com amigos de uma juventude vital, encontrei o frio imenso, ou os limites claros das possibilidades de habitação dos lugares. Mas foi também o fascínio do branco que desce dos céus, povoa a terra, que vislumbrei o enunciar da arte como diferença de humanidade na interpretação de possibilidades de sobrevivência. Desta montanha nevada descemos o rio Mondego. Passamos por Coimbra, uma cidade de memórias, prosseguimos para esse mesmo mar que encontráramos na foz do Douro, ou do Vouga, em Aveiro, que passa tão perto, a norte da cidade que agarra todos estes lugares. Viseu é uma paisagem convergente que liga geografias distantes.
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Castelo Velho, Vila Chã de Sá, 1996 |