[Gerês 24] Esta viagem ao Gerês, aqui apontada, foi feita pelos cumes, entre o céu e a terra. Foi um caminhar nas terras altas para uma leitura topológica dos elementos estruturais da montanha. Quando folheamos Árvores do Parque Nacional da Peneda-Gerês, depara-mo-nos com outra viagem, com outra proposta, muito próxima, e simultaneamente distante, dos topos despidos da serra. É o mundo da floresta autóctone, um universo denso e fascinante, mutante, sujeito à uma enorme variabilidade provocada pelas estações do ano. O Gerês é este complexo de várias faces, impossíveis de abarcar de uma só mirada. Miguel Dantas da Gama trabalhou durante quatro anos numa intensa recolha fotográfica para fixar as cores desta terra interior, deste labirinto sobrevivente a centenas de anos de incêndios, de práticas agrícolas nocivas a ecossistemas de uma riqueza extraordinária. Se nas cotas mais elevadas da serra do Gerês, entre o cinza do granito e o azul do céu, parece tocarmos o cosmos, no interior da floresta estamos próximos do coração da terra. Verde, castanho, vermelho, amarelo, o som da água corrente, a luz coada pelas copas das árvores, a humidade do ar, um chão de sedimentos acumulados, o ocasional canto das aves, tudo é aqui diferente, neste convite irrecusável a uma viagem de seres enormes e misteriosos que se elevam na direção do espaço sideral.
(Miguel Dantas da Gama, Árvores do Parque Nacional da Peneda-Gerês, edição Canhões de Pedra, Porto, 2011)