sexta-feira, 3 de outubro de 2014

"Projetar e Construir a Nação", de Marta Macedo

Projetar e Construir a Nação - Engenheiros, ciência e território em Portugal no século XIX, de Marta Macedo, é um livro que nos dá conta do princípio de um movimento que não terá retorno: o da transformação do território por ação das obras humanas. Se o processo de transformação da paisagem começa, de forma progressiva com o neolítico e o advento da agricultura, com a fixação de comunidades humanas a espaço restritos, e posterior desenvolvimento de povoados que vão dar origem a cidades, é no século XIX que, verdadeiramente, se vai operar a mudança decisiva. O caminho de ferro, a ânsia de abranger de uma forma rápida, segura e confortável, todo o território, será a ambição de políticos, governantes que, pelo aprofundamento dos estudos em engenharia, levarão a cabo um plano ferroviário que se estende a todo o espaço português de, então, metrópole, ou centro de império colonial.

O livro divide-se em três partes, que por si, esclarecem o conteúdo deste projeto editorial de envergadura, que partiu das investigações para uma tese de doutoramento. Escola de Exército: a formação de uma elite técnico-científica; Conselho de Obras Públicas: a racionalização de administração e, a terceira parte, Douro: a construção do território e a invenção da paisagem.

O último capítulo é dedicado à fotografia, que é praticamente contemporânea do comboio. A imagem fotográfica irá constituir-se, desde o início, como uma poderosa ferramenta de propaganda, ao mesmo tempo que parece tornar acessíveis lugares distantes.

«Primeiro acompanhando a construção do caminho-de-ferro e depois retratando a paisagem da vinha, a fotografia chega ao Douro em meados da década de 1870. Se o caminho-de-ferro e a agricultura científica fazem parte do complexo processo de colonização do território português oitocentista, este processo de colonização não terminava ao colocar o último carril ou ao plantar o último pé de vinha enxertada. O novo território racional, ordenado e produtivo, tinha de se tornar visível para poder fazer parte dos espaços imaginados que constroem a nova identidade nacional. Para isso não bastavam os registos da ciência estatística ou cartográfica, nem mesmo as memórias impressivas daqueles que viajavam pelo Douro. Era necessário produzir e fazer circular imagens do Douro. Deste modo, durante a segunda metade do século XIX, os fotógrafos vão-se transformando em actores quase tão importantes como os engenheiros. Afinal ambos partilham um mesmo projecto para o país. Ambos querem construir uma nação. Mas enquanto os últimos fabricam o território, os primeiros interpretam e traduzem essa nova realidade, inventando a imagem da paisagem.» (pp.307)

Edição Imprensa de Ciências Sociais. Lisboa. 2012


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