Duarte Belo e Álvaro Duarte de Almeida. Vértice geodésico de São Gabriel. 1995 |
Vale do Côa, regresso [18]. Esta viagem, como as anteriores dos anos 90, foram feitas na companhia de Álvaro Duarte de Almeida, que conheci em 1985, quando foi meu professor de Geometria Descritiva, na Escola Secundária D. Pedro V, em Lisboa. Com ele e com outros colegas, seus alunos, fiz as primeiras viagens por Portugal. O modelo das viagens era precário. Deslocávamo-nos para os pontos de partida de transportes públicos e, quase sempre, iniciávamos uma caminhada de vários dias, por serras ou vales de rios, que apesar de nem terem passado muitos anos, eram na altura muito diferentes. O tempo era passado em caminhada por paisagens que todos nós descobríamos com o espanto de algo que não fazíamos sequer ideia que pudesse existir. Havia a revelação de um país; era a geografia comum, o património cultural, os elementos de uma identidade portuguesa, diversa e impalpável. Nos fins de tarde de Verão estendíamos um saco-cama no chão e, em noites de céu limpo, tínhamos metade do Universo em frente do nosso olhar. O Álvaro Duarte de Almeida tinha essa capacidade rara de ao seu redor reunir pessoas a quem transmitia uma sabedoria imensa, o fascínio pela condição de estar vivo, pelas paisagens contínuas e intermináveis, pelos gestos humanos deixados num solo comum a definir um passado e a enunciar o futuro. Cada viagem era o caminhar por milhões de anos da dimensão geológica da fabricação do nosso planeta, ou milhares de anos de laboriosa construção da civilização humana. O tempo foi passando e uma geração de seus alunos teve este privilégio de um habitar verdadeiramente singular. Na vida há poucas pessoas que nos constroem, que nos sugerem que a liberdade vale a pena ser vivida, que uma existência não deverá deixar de olhar um céu escuro de pontos luminosos, imaginar mundos próximos e distantes.
Aqui termina este conjunto de textos de revisitação ao vale do Côa.
Álvaro Duarte de Almeida e Duarte Belo. Vértice geodésico de São Gabriel. 2012 |
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