Obras de ampliação da torre de depósitos da Biblioteca Nacional de Portugal. Lisboa. 2010 |
[Negativos arq. #4] A biblioteca é a construção da cidade, aqui com o acrescido sentido de conter uma parte significativa da produção erudita de toda cultura de Portugal, que em muito transcende os limites da cidade de Lisboa. Há uma modelação da urbe, ou mesmo de um país, imaginada num edifício. Habitar um prometido universo de livros, um lugar de onde poderíamos não sair e aí conhecer todo o mundo. Esse lugar está em construção e é visitado regularmente, na elaboração de um levantamento fotográfico documental. É observado a crescer na revelação de todos os segredos de uma estrutura humana, a matéria do paulatino erguer da cidade. Muitas destas fotografias são a procura de uma origem. As fotografias da obra de ampliação da torre de depósitos da Biblioteca Nacional de Portugal, em Lisboa, são o acompanhar de um nascimento, do crescimento de um ser. É como fotografar uma criança desde o seu nascimento até ao inicio da idade adulta, no momento em que, definitivamente, a sua consciência se emancipa, se assume com destino próprio, onde se desenvolverão, autonomamente, opções de sentido. As fotografias de uma criança, de um filho, são como que o registo da nossa própria infância, do tempo mágico de um começo que não nos será acessível no futuro, mas que, progressivamente, vamos construindo, como se tratasse de irmos encontrando, fragmentados, os pedaços desmedidos que formaram a coerência da nossa vida. Estas fotografias da Biblioteca são isso: o revelar de uma infância, de um tempo breve a que rapidamente deixaremos de ter acesso, mas que assim fica registado para que possa ser revistado num qualquer momento. Descobriremos mais tarde que, apesar de todo este investimento, num número muito elevado de fotografias, alguns milhares, também aqui o tempo se esvai, fora então impossível agarrar numerosas dimensões significantes de um processo evolutivo que pretendêramos fixar. Este é aqui um dos sentidos pungentes do documentalismo: revelar todas as suas impossibilidades e mostrar o ponto de contacto entre as linguagens da expressão e da interpretação, que, a princípio talvez se quisesse evitar.
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