s/t. 2011 |
Há um documentalismo que caminha para a obsessão, para o pretenso registo total e completo, onde nada falta, de um aspecto da realidade. Nesta tarefa impossível reside o equilíbrio precário e fascinante do que ficará registado e do que vai perder-se. Há o momento do registo, do diálogo com a luz reflectida, com o visível, com uma realidade espacial. Um facto sempre analógico, o habitar o tempo presente que permanentemente se escoa. Este é um dos elementos mais paradoxais da fotografia, seja ela de que género for: nunca podemos voltar atrás, há uma relação directa e irredutível com o tempo passado, ao qual não se regressa, como as águas de um rio no movimento incessante do seu fluir. Um poema pode ser reescrito, pode voltar-se a ele numerosas vezes. A fotografia acaba no momento do seu registo. Esta é, no entanto, uma realidade que pode estar a ser alterada. O manuseamento digital da imagem permite, com relativa facilidade, alterar uma fotografia, sem que seja perceptível essa alteração, que pode ser mais ou menos significativa. Mas mesmo esta possibilidade abre-nos as portas de um outro mundo em que a verdade e a não-verdade convivem de uma forma ambígua e fascinante. É um mundo que, com cada vez menos limitações, mostra de facto o que cada um de nós vê, cada fazedor, sem limitações impostas pelos meios de registo. Poderá ser este um mundo complexamente perverso, mas, ao mesmo tempo, encerra em si a sedução de um jogo com regras fragmentadas que nos poderão abrir um ângulo visual mais vasto, novas formas de habitar e ser humano. É nesta procura, em que nos podemos perder, em que nos podemos encontrar, em que podemos desenvolver uma maior capacidade de comunicar.
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