domingo, 30 de junho de 2013

Atenção

[Entrevista JEF 17] A fotografia não tem a atenção mediática que têm outras áreas de conhecimento, por isso passa mais despercebida. Também não goza de uma força corporativa de outras áreas das comunicação. Continua a ser entendida, muitas vezes, como a ilustração de alguma coisa que acompanha um texto. Creio haver um desfasamento da sua real importância no contexto das sociedades contemporâneas, e a forma como a mesma é compreendida. A fotografia será um dia interpretada como um meio construtor de uma identidade humana em que ela vem participando, desde o seu primeiro disparo. A afirmação da sua autonomia talvez se integre num tempo vindouro, mais liberto dos atuais cânones de comunicação. O seu crescimento depende de uma estrutura mais bem definida, de mais organização, de operadores de elevado rigor e profissionalismo, de um diálogo aberto com outros ramos criativos e científicos. (Este foi o último excerto da entrevista feita por José Eduardo Franco e publicada na revista Letras com Vida, nº5).

sexta-feira, 28 de junho de 2013

Reinventar

[Entrevista JEF 16] No que diz respeito à forma como os jovens talentos são valorizados, a questão já é muito subjetiva, situação que não será muito diferente daquela que se passa noutras áreas criativas. Creio ser muito importante não esmorecer se o nosso trabalho não for reconhecido como gostaríamos. Há que acreditar naquilo que fazemos e, paulatinamente, sabermos construir a nossa própria "casa", o nosso espaço, com os pés bem assentes na terra, mas com a capacidade de nos reinventarmos em permanência, quanto mais não seja para nos adaptarmos constantemente a um mundo em mudança.

quinta-feira, 27 de junho de 2013

Talentos

[Entrevista JEF 15] José Eduardo Franco: Como aprecia o estado da prática da fotografia em Portugal? Há novos talentos? Como são formados e valorizados? Há formação de qualidade no campo da fotografia?

Há concerteza novos talentos na fotografia. A fotografia não foge à regra de uma exigência cada vez maior, dada a também maior competitividade que existe dentro do mercado e das várias práticas que, grosso modo, se separariam entre o documental e fotografia plástica. Mas, como atrás referi, vai sendo cada vez mais difícil estabelecer uma fronteira clara entre estas duas atitudes. Há gente a trabalhar com grande rigor, determinação e profissionalismo. Também creio que há formação de qualidade, embora não seja uma área em que eu tenha um conhecimento aprofundado. Estive recentemente a participar numa iniciativa enquadrada no Mestrado em Fotografia do Instituto Politécnico de Tomar, e fiquei muito bem impressionado com a qualidade do trabalho que lá está a ser desenvolvido.

terça-feira, 18 de junho de 2013

na história da arte

Guadiana, prox. Moura. 1998

[Entrevista JEF 14] O lugar da fotografia na História da Arte tem vindo a adquirir um significado cada vez maior, particularmente nas últimas décadas. Pelas questões que coloca na relação que estabelece com o fotografado, pelo seu significado ambíguo e plástico, pela acessibilidade da sua expressão, a fotografia é parte integrante da Arte contemporânea. Ainda há resquícios de um debate sobre o que é ou não é Arte, mas creio que se está a assistir ao esbatimento das considerações sobre todas as classificações ou categorias de trabalhos criativos. Os diversos fazeres vão-se assumindo na sua singularidade. Este é um desafio estimulante da contemporaneidade: como vamos evitar perder-mo-nos neste universo em que a informação circula a velocidades antes impossíveis de imaginarmos? A Arte pode perder a sua própria materialidade e passar a ser um conceito de sobrevivência, de sanidade mental, de lucidez, de fascínio perante um mundo em permanente construção, sobre a erosão constante de todos os saberes.

terça-feira, 11 de junho de 2013

Organização narrativa

[Entrevista JEF 13] Se pegarmos num bom livro sobre o estado da fotografia contemporânea, observamos uma extraordinária diversidade de abordagens possíveis. Não será fácil situar o nosso próprio trabalho numa corrente estética determinada, nunca procurei esse enquadramento. Naquilo que gostaria que fosse o meu trabalho, a fotografia é cada vez mais um elemento que dialoga com outros, como seja o texto, cada vez mais presente, ou a organização de uma narrativa que tento conferir aos meus trabalhos. Entendo a fotografia como fazendo parte integrante de um processo de comunicação, de contaminação benéfica, de partilha de leituras da realidade, por um lado, e a construção de um contido universo de saber que pode albergar uma determinada coerência.

sexta-feira, 7 de junho de 2013

Expressão poética

Serra da Estrela. 2013

[Entrevista JEF 12] José Eduardo Franco: Podemos defini-lo como um poeta da paisagem utilizando “a escrita da fotografia”? Revê-se neste perfil? Tem alguma corrente estética de referência onde se inscreva? Como definiria o seu modo de praticar a fotografia? É uma arte à parte? Qual o seu lugar na História da Arte?


Penso ser importante, num contexto de comunicação, escrita ou visual, procurar elementos expressivos que enquadrem a forma da mensagem, reflexo de um conceito que se quer partilhar. Algum carácter entendido como poético que as minhas fotografias possam ter, terá de ser adjetivado por  leitores que assim o interpretem. Talvez tenha começado com esse intuito, mas cada vez mais me senti seduzido pela fotografia como documento, sem, no entanto, ter qualquer pretensão jornalística, ou procurado uma fotografia objetiva. Procurava o registo de um fascínio pelos lugares, por uma cultura, de alguma forma pelo entendimento da vida. Hoje gosto de "navegar" entre a arte e o documento, penso, aliás que essa distinção é cada vez mais difícil de definir. É importante elaborar objetos de expressão, como uma fotografia ou conjuntos de fotografias, que comuniquem alguma coisa a alguém, que estimulem a reflexão sobre aquilo que pretende mostrar. Mais do que uma bela imagem para pôr na parede, há a fixação de um certo sentido da relação do Homem com as paisagens, sejam elas naturais, rurais ou urbanas.

quinta-feira, 6 de junho de 2013

Negar e afirmar

Lisboa. 2012


[Entrevista JEF 11] As fotografias podem ser uma viagem pela integração dos fragmentos dispersos de uma existência, pela negação da eternidade, pela afirmação do sentido da construção da cidade dos humanos, síntese maior da adaptação de uma espécie que, ao longo de milhões de anos de evolução, desenvolveu a consciência de si, criou o seu espaço e poderosas ferramentas para a leitura da invisível e inacessível realidade do infinitamente pequeno, mundo quântico, e do incomensuravelmente distante, representado por imponderáveis pontos luminosos na escuridão gelada.

quarta-feira, 5 de junho de 2013

Operar

Pátio dos Reis. Lamego. 2013


[Entrevista JEF 10] Creio que um dos maiores desafios do conhecimento contemporâneo é a forma como se poderão ligar disciplinas aparentemente, e historicamente, isoladas. Uma outra questão não menos importante é a da comunicação da informação. Num universo de saber cada vez mais denso, complexo e quase impenetrável, como se poderá tornar acessível esse mesmo conhecimento a diversas áreas muito diferenciadas entre si e como poderá ser divulgada, de forma tão simples quanto possível, essa mensagem para um público vasto? Talvez estejamos numa fase do desenvolvimento científico e social em que urge comunicar, sair de campos relativamente fechados, para partilhar os saberes e as metodologias de investigação díspares, com a expressão artística, que frequentemente opera num mundo que parecerá especulativo, mas que, não raras vezes, representa a antevisão de um futuro próximo.

terça-feira, 4 de junho de 2013

Fusão

Ilha do Pico. Açores. 2008

[Entrevista JEF 09] Fotografia, Filosofia, Literatura, História. Há, no meu entender, uma questão muito importante para a reflexão sobre os vários campos disciplinares. Como se liga hoje o saber erudito, expresso sobretudo pela palavra, pelas expressões de representação espacial, pela imagem, em variados suportes, pelo som, com a realidade visível, com o objeto da fotografia?
Ilha do Pico. Açores. 2008

segunda-feira, 3 de junho de 2013

Motivação

Praia do Guincho. 2013

[Entrevista JEF 08] José Eduardo Franco: De algum modo, tem investido muito na criação/produção fotográfica em torno de motivos ligados ao património natural e à herança cultural e arquitectónica portuguesas. O que o motiva? Pretende fazer uma espécie de história da cultura portuguesa pela fotografia? Será que pratica a fotografia como uma espécie de redenção da nossa identidade? Como interliga fotografia, Filosofia, Literatura e História? 

O que me motiva é um forte desejo de representação do espaço português. Quero apenas registar o fascínio por um caminhar humano, que de uma forma por vezes tão clara, se encontra no território hoje Portugal desde o paleolítico, desde a chegada das primeiras comunidades humanas, até ao tempo atual. De alguma forma gostava que o meu trabalho pudesse constituir uma referência para uma leitura do espaço português no tempo presente. O que me move é a terra e a tentativa do entendimento do próprio gesto de fotografar, do processo criativo de uma maneira geral, da fuga que ele representa à noção de passagem do tempo. Num país em que o Minho é tão diferente do Algarve, por exemplo — estando estas duas regiões muito mais próximas, em termos de identidade, da Galiza e da Andaluzia, respetivamente — tenho uma enorme dificuldade em definir a identidade Nacional, talvez não tanta em definir a identidade regional.