segunda-feira, 31 de outubro de 2022

Fluxo

[três viagens 56] Há um momento em que integramos o fluxo cósmico da matéria. Aproximações a um conhecimento mais profundo da realidade que nos é trazido, em fragmentos, por notáveis personalidades da ciência, da arte, da literatura, de todos os ramos do saber. A claridade possível que nos é dada pela ciência, sabendo que, permanentemente estamos em viagem, em caminho. 


 

quarta-feira, 26 de outubro de 2022

Paradoxo

[três viagens 55] Regressar onde? É a constatação paradoxal de um tempo interminável e de uma viagem breve na procura de um país. O movimento contínuo no desenho de um mapa. A geometria de linhas sobre lugares, a união de espaços desconexos, um específico exercício de vida. Tentativas e aproximações topológicas à interpretação do espaço e do tempo.


 

segunda-feira, 24 de outubro de 2022

Produção de sentido

[três viagens 54] Um trabalho concreto levou-me a fazer as três viagens relatadas nestas palavras. A construção de um artefacto de comunicação, um livro, uma tentativa de sistematização visual de alguns aspetos da paisagem portuguesa. Buscar também algum tempo disponível para fazer coisas diferentes com a fotografia. O calendário do registo dos lugares era muito folgado. Eram pontos muito específicos na paisagem, que eu procurava. Fiz desses lugares o desejo de uma representação fotográfica mais extensiva, ao mesmo tempo que refletia sobre o movimento performativo que a fotografia pode operar, como jogo de produção de sentido.


 

domingo, 23 de outubro de 2022

Persistir

[três viagens 53] As noites no campo e a madrugada fria. Os campos cobertos de geada, alguma surrealidade e identificação de uma paisagem dura, agreste, o labor humano que tende a desaparecer, pelas melhorias das condições de vida. Mas há quem persista nos campos do tempo antigo. Seria curioso saber porquê. Em muitos casos não haverá em tal atitude uma necessidade de compor a economia doméstica. Arriscaria um desejo de terra, a continuidade da luta de antepassados. Um sentimento de vida, de vigor, a que algumas pessoas associaram aos trabalhos agrícolas, ao contacto com a terra, a necessidade mesmo, de sentirem o corpo. Esta interpretação resulta de uma transposição literal a partir do meu próprio trabalho, de um sentido apelo da terra, dos lugares, como se fosse uma atividade há muito aprendida a agora continuada, num movimento perpétuo.


 

sexta-feira, 21 de outubro de 2022

Ambiguidade

[três viagens 52] As fotografias contêm em si a ambiguidade de fixarem a imagem retiniana, o espaço e o tempo petrificados. Mas essa petrificação servirá o seu oposto, a irredutível noção da passagem do tempo, a afirmação inquestionável de que tudo muda, que a permanência não existe, que habitamos, todos, uma vertigem, que a vida pode ser um jogo e uma abstração de que apenas. Momentaneamente saltamos fora e habitamos um significado diferente da própria vida. Os trabalhos no campo são essa distração, o mergulho num tempo base, anterior à tomada de consciência da passagem do próprio tempo, uma juventude revivida, em que a eternidade era possível.


 

quinta-feira, 20 de outubro de 2022

Regressar?

[três viagens 51] Estes lugares, periféricos talvez, são um mundo profundamente diferente daquele que fotografara em Lisboa, quando, há não muito tempo, percorria, a pé, a linha de cintura da cidade. É assim este trabalho, o registo do espaço português, das cidades, das aldeias, dos territórios de alta e de baixa densidade, de um imenso labirinto que se estende e se liga a lugares distantes, cujo significado nos escapa, ou que esse mesmo significado é dinâmico, evolutivo, permanentemente reescrito.


 

 

terça-feira, 18 de outubro de 2022

Do rio

[três viagens 50] Nas margens deste rio de águas límpidas terminava o périplo célere por Portugal. Três viagens em fragmentos de um país inteiro. Tinha agora cerca de duas horas de viagem para regressar a Viseu.

Rio Angueira, Algoso, Vimioso, 2022

 

segunda-feira, 17 de outubro de 2022

Algoso

[três viagens 49] Algoso é uma antiga povoação onde a antiga casa da câmara e o pelourinho nos falam de poderes administrativos antigos que entretanto se perderam. Destes símbolos faz parte, também, o castelo que, pela sua localização, sobranceiro ao rio Angueira, é dos mais singulares de todo o espaço português. Do castelo desci ao leito do rio, a uma ponte medieval que hoje permanece a ligar as duas margens. A jusante deste ponto de atravessamento, o leito do rio é composto por penedos ciclópicos, de xisto e de quartzo, que assumem formas irregulares, onde o polimento provocado pela erosão fluvial parece ter deixado expostos desenhos de mapas, de representação de paisagens indecifráveis, a que hoje não temos acesso.

Algoso, Vimioso, 2022

 

sábado, 15 de outubro de 2022

Penas Róias

[três viagens 48] Estive uma primeira vez em Penas Róias no dia 14 de setembro de 1990. Tinha partido em caminhada de Miranda do Douro, de onde segui para Duas Igrejas e aí tomara como itinerário a linha ferroviária do Sabor. Fora na proximidade desta aldeia que abandonara a linha férrea, na altura desativada há dois anos, para visitar o castelo. Depois segui para Azinhoso, para visitar a igreja românica. Volto ao tempo presente. À saída de Penas Róias fotografei um terreno com amendoeiras em flor, com a luz rasante do pôr do sol. Subi ao cabeço de Nossa Senhora da Assunção, onde foi erguida uma capela. A amplitude visual que podemos usufruir do local é impressiva. O dia estava a findar. Procurei um local sossegado para passar a noite.

Penas Róias, Mogadouro, 2022

 

 

sexta-feira, 14 de outubro de 2022

Miradouro de Picões

[três viagens 47] Peredo da Bemposta, foi o regresso a um Douro monumental, a um impressionante canhão fluvial aberto no planalto granítico ao longo de milhões de anos.

Miradouro do Picão, Peredo da Bemposta, Mogadouro, 2022

 

 

quinta-feira, 13 de outubro de 2022

Algosinho

[três viagens 46] Algosinho, uma pérola da arquitetura românica, uma estranha sobriedade nas suas proporções, no seu desenho, de acentuada horizontalidade, a contrariar o modelo dominante no Minho, onde as igrejas românicas são verticais, com um carácter de fortaleza mais vincado.

Algosinho, Mogadouro, 2022

 

quarta-feira, 12 de outubro de 2022

Miradouro da Penha das Torres

[três viagens 45] Paradela, era o meridiano mais afastado, a nascente, de Lisboa. Não deixei de fotografar uma parte significativa da aldeia, mas o que verdadeiramente procurava era o ponto, marcado pelo miradouro da Penha das Torres, sobranceiro ao rio Douro, à Presa de Castro, uma barragem espanhola. Este é o ponto onde o rio encontra o território hoje português, e inflete na direção sudeste, definindo uma fronteira entre os dois países ibéricos. 

Miradouro da Penha das Torres, Miranda do Douro, 2022

 

segunda-feira, 10 de outubro de 2022

Frio, geada

[três viagens 44] Entretanto a noite aproximava-se. A temperatura baixava acentuadamente. Na madrugada seguinte os campos estavam cobertos de geada. O termómetro do carro marcava 4Cº negativos. Passei perto de Vale de Pena. Avancei para Cicouro, outra aldeia nas proximidades da fronteira com Espanha. As aldeias da raia que, verdadeiramente, não sentem, não estão em nenhuma fronteira, são mundos distantes, isolados, entregues a si próprios, presos a um arcaísmo que parece não estar inserido no quotidiano célere das cidades.

Quinta de Vale de Pena, prox., Pinelo, Vimioso, 2022

 

sexta-feira, 7 de outubro de 2022

Fronteira, Quintanilha

[três viagens 42] Quintanilha, uma fronteira que deixou de existir, símbolo civilizacional de um mundo humano que quer ser comunidade. A autoestrada, relativamente recente, deixara o antigo posto de fronteira com movimento muito reduzido.

Fronteira, Quintanilha, Bragança, 2022

 

quinta-feira, 6 de outubro de 2022

Vinhais

[três viagens 41] Vinhais não fazia parte do itinerário fotográfico mas não resisti a uma paragem para algumas fotografias. Há muitos anos, em 1990, tinha aqui chegado, de autocarro, para uma caminhada de atravessamento do parque natural de Montesinho, justamente de Vinhais a Bragança, pela raia, sem deixar de passar em Rio de Onor e Guadramil. A primeira paragem fora, justamente, o cabeço de Cidadelhe, um vértice geodésico que entretanto foi transformado em miradouro e ponto de observação de aves. Mas o que mais significativo tem este lugar são os vestígios de uma antiga muralha, anterior à romanização. 

Vinhais, 2022

Vinhais, 2022

Vinhais, 2022

 

quarta-feira, 5 de outubro de 2022

Castanheiros antigos

[três viagens 40] A Serra da Corôa estende-se a norte de Vinhais. É uma montanha povoada e de baixa altitude. Nesta região transmontana procurava castanheiros antigos, de grandes dimensões. Encontrei esse souto num declive da serra, alinhados, imponentes.

Vale de Espinho, Vilar de Ossos, Vinhais, 2022

 

segunda-feira, 3 de outubro de 2022

Pinheiro Novo

[três viagens 39] Em Pinheiro Novo, a minha paragem seguinte, a realidade era semelhante a Cisterna. Uma pequena aldeia granítica, onde não faltavam novas construções, mas marcada por silêncio e solidão. Prossegui para Moimenta, na direção Este. Fotografei a igreja, com duas torres, com uma escala contida e equilibrada. 

Pinheiro Novo, Vinhais, 2022

 

domingo, 2 de outubro de 2022

Cisterna

[três viagens 38] A caminho de Cisterna, de manhã, faço algumas fotografias com o chapéu de chuva na mão. Foi já naquela povoação que deixou de chover. Deverei ter percorrido todas as ruas. Apenas encontrei duas pessoas que estavam a trabalhar na obra de uma casa. Estivemos um pouco na conversa. A linha de fronteira com Espanha estava a escassas centenas de metros. Convidaram-me a entrar, para um café. Agradeci e prossegui o meu trabalho nesta aldeia que começava a despertar. Os fogos acesos em algumas habitações libertavam fumo pelas chaminés.

Cisterna, Vinhais, 2022

 

sábado, 1 de outubro de 2022

Noite, chuva

[três viagens 37] Aproveitei a noite para me aproximar do ponto que iria fotografar no manhã seguinte: Cisterna e Pinheiro Novo, no concelho de Vinhais. Foram cerca de duas horas de viagem. Já próximo do ponto de destino, com a ajuda das imagens de satélite do Google Maps, procuro um local para pernoitar. A noite não foi fácil. Antes da meia noite começara a cair uma chuva copiosa que não mais pararia até de madrugada.

Pinheiro Novo, prox., Vinhais, 2022